A decisão do governo dos Estados Unidos de incluir o ministro Alexandre de Moraes na Lista de Nacionais Especialmente Designados (SDN), sob a Lei Global Magnitsky, marcou um ponto de inflexão sem precedentes nas relações entre Brasília e Washington. A medida impõe o congelamento imediato de ativos ligados ao magistrado em território americano e afeta até transações feitas em dólares fora dos EUA.
Segundo Marcelo Crespo, advogado especializado em direito internacional e com certificação em gestão e negócios, todos os bens e interesses vinculados a Moraes, direta ou indiretamente, ficam bloqueados em qualquer operação que envolva o sistema financeiro norte-americano. Isso inclui contas bancárias, ações em bolsas dos EUA ou participações em empresas com sede no país.
A proibição também recai sobre cidadãos e instituições norte-americanas, impedidos de fornecer ou receber recursos, bens ou serviços do ministro. Além disso, entidades estrangeiras que tentem burlar as sanções ou realizar transações significativas com ele podem ser atingidas por sanções secundárias, como multas ou restrições comerciais.
Embora a legislação norte-americana não obrigue outros países a seguirem essas diretrizes, o impacto global do sistema financeiro dos EUA cria um efeito dominó. “Muitos bancos internacionais, mesmo fora da jurisdição americana, preferem evitar riscos e bloqueiam contas ou recusam transações com pessoas sancionadas, para não comprometer suas próprias operações”, explica Crespo.
O alcance da medida vai além de sua dimensão financeira. Para Crespo, trata-se de uma “escalada institucional com forte potencial de crise diplomática”, colocando em xeque a independência do Judiciário brasileiro e criando um precedente jurídico grave ao mirar uma autoridade de alto escalão em um país democrático.
A Lei Global Magnitsky foi criada originalmente para punir violações de direitos humanos e corrupção em regimes autoritários. Sua aplicação a um ministro do Supremo Tribunal Federal do Brasil representa uma inovação agressiva e questionável na ordem jurídica internacional. Isso porque, segundo juristas, a norma exige provas robustas de má conduta, geralmente respaldadas por instâncias internacionais. No caso de Moraes, a sanção se deu por decisão executiva, sem qualquer julgamento.
A tensão entre os governos de Joe Biden e Luiz Inácio Lula da Silva, já elevada desde o início de julho, intensificou-se após o presidente Donald Trump – que reassumiu o cargo após vitória eleitoral – tomar uma série de ações hostis. Primeiro, Trump impôs tarifas de 50% sobre produtos brasileiros. Depois, seu secretário de Estado, Marco Rubio, anunciou a revogação dos vistos americanos para ministros do Supremo e familiares. E, no último dia 30, veio a sanção oficial contra Moraes.
A resposta brasileira pode vir no fortalecimento de alternativas autônomas. Casos como o da Rússia em 2014 mostram que, diante de sanções, é possível criar mecanismos financeiros internos que permitam a continuidade de operações domésticas. O Sistema de Transferência de Mensagens Financeiras (SPFS), desenvolvido por Moscou após a ameaça de exclusão do Swift, é um exemplo de solução técnica viável, ainda que limitada em escopo internacional.
No Brasil, estruturas como as operadas pela Caixa Econômica Federal poderiam, com apoio do Banco Central e do governo, viabilizar uma rede nacional de pagamentos imune a sanções externas. Tal medida não resolveria o problema da exclusão do sistema financeiro global, mas protegeria a capacidade de agentes públicos manterem suas operações básicas em território nacional.
Diante da escalada, a crise não é apenas diplomática ou jurídica, mas também um alerta sobre os limites da soberania nacional num mundo financeiro interconectado. A sanção contra Alexandre de Moraes abre um capítulo delicado na história recente das relações internacionais brasileiras.
* Com informações das fontes:
- Marcelo Crespo, advogado especializado em Direito Internacional e Governança
- Congresso em Foco (reportagem de 2025 sobre as sanções)
- Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros (Ofac), Departamento do Tesouro dos EUA
- Declarações públicas do governo dos Estados Unidos e da Presidência da República do Brasil
- Histórico da Lei Global Magnitsky
- Relatórios sobre o sistema SPFS da Rússia (2014–2022)
* Vicente Barone é analista político, editor chefe do Grupo @HORA de Comunicação, esteve à frente de diversas campanhas eleitorais como consultor político e de marketing, foi executivo de marketing em empresas nacionais e multinacionais, palestrante nacional e internacional para temas de marketing social, cultural, esportivo e de trasnporte coletivo, além de ministrar aulas como professor na área para 3º e 4º graus - www.barone.adm.br