"> José Antonio Kast recoloca Chile no eixo da direita e reabre disputa ideológica na América do Sul

 

Internacional - 15/12/2025 - 07:25:53

 

José Antonio Kast recoloca Chile no eixo da direita e reabre disputa ideológica na América do Sul

 

Da Redação .

Foto(s): Divulgação / Heute

 

A eleição de José Antonio Kast no Chile aprofunda a polarização política regional, anima governos alinhados à direita e impõe um teste à convivência com administrações de esquerda na América Latina e com os Estados Unidos.

A eleição de José Antonio Kast no Chile aprofunda a polarização política regional, anima governos alinhados à direita e impõe um teste à convivência com administrações de esquerda na América Latina e com os Estados Unidos.

O líder do Partido Republicano, de 59 anos, consolidou a virada no segundo turno ao atrair o eleitorado de centro e de outras siglas conservadoras, depois de chegar atrás de Jeannette Jara na primeira rodada de votação em novembro. Com quase toda a apuração concluída, Kast superou 58 dos votos válidos, contra pouco mais de 41 da adversária, numa disputa que reeditou a clivagem entre continuidade do governo Boric e promessa de ruptura com a agenda da esquerda.​

A candidata comunista reconheceu a derrota ainda na noite de domingo, telefonou para o vencedor e afirmou que a democracia “falou forte e claro”, em um gesto visto por analistas como sinal de estabilidade institucional após uma campanha tensa e marcada por denúncias mútuas de medo econômico e retrocessos em direitos. A transição prevê que Kast receba a faixa presidencial de Gabriel Boric em março do ano que vem, mantendo a tradição de alternância de poder que tem marcado o Chile desde 2010.​

Agenda interna: segurança e economia

Durante a campanha, Kast fez da segurança pública o eixo central de seu discurso, defendendo aumento do poder policial, o envio de militares para áreas consideradas críticas e a criação de um “escudo fronteiriço” para conter o crime organizado e a imigração irregular. O projeto inclui reforço de barreiras físicas na fronteira com a Bolívia e maior presença de tropas em zonas de maior fluxo migratório, proposta que agrada setores preocupados com violência, mas desperta críticas de organizações de direitos humanos e de parte da vizinhança andina.​

Em economia, Kast promete flexibilizar leis trabalhistas, reduzir entraves regulatórios e reorientar políticas sociais, apostando na atração de investimentos e no fortalecimento da iniciativa privada como caminho para recuperar o crescimento após anos de baixo dinamismo. Para defensores desse plano, a plataforma recoloca o Chile na trilha liberal que fez do país uma vitrine regional em décadas passadas, enquanto críticos alertam para risco de aumento da desigualdade e de enfraquecimento de avanços em educação, saúde e previdência conquistados sob governos de centro-esquerda e esquerda.​

Reações na América Latina

A vitória de Kast foi rapidamente saudada por presidentes e líderes políticos latino-americanos, revelando de forma nítida a divisão de expectativas em torno do novo governo chileno. Na Argentina, Javier Milei celebrou o resultado como um “esmagador triunfo” e o descreveu como mais um passo da região em defesa da vida, da liberdade e da propriedade privada, associando a eleição chilena ao avanço de uma agenda frontalmente contrária ao que chama de socialismo do século XXI.​

Governos de centro-direita e direita em países como Paraguai, Equador e Bolívia enviaram mensagens calorosas, enfatizando afinidade em temas como segurança, defesa da família e economia de mercado. Para esses aliados, a presença de Kast em La Moneda facilita a formação de um bloco mais coeso em fóruns regionais e pode fortalecer negociações comerciais e posições comuns sobre crise migratória e crime transnacional. Já administrações de esquerda, embora tenham reconhecido o resultado e cumprimentado o novo presidente eleito, observam com cautela a mudança de rumo em um país que, poucos anos atrás, era símbolo de um ciclo progressista com a chegada de Boric ao poder.​

Brasil entre pragmatismo e divergências

Do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva parabenizou Kast e o povo chileno, ressaltando o caráter democrático e ordenado da eleição e afirmando que pretende seguir trabalhando para fortalecer as relações bilaterais e os laços econômicos entre os dois países. A mensagem sinaliza uma tentativa de separar divergências ideológicas da agenda prática, preservando cooperação em comércio, energia e integração regional, mesmo com a chegada de um presidente de direita a um dos parceiros mais relevantes do Cone Sul.​

Entre diplomatas e analistas brasileiros, há avaliação de que a relação com Kast exigirá um equilíbrio delicado: de um lado, a pressão de bases e aliados à esquerda para criticar eventuais retrocessos em direitos civis e sociais no Chile; de outro, o interesse econômico em manter pontes abertas com um governo que pode apoiar iniciativas de abertura comercial e flexibilização de barreiras tarifárias no entorno do Mercosul. Críticos do alinhamento automático a governos ideologicamente próximos defendem que Brasília adote uma postura estritamente pragmática, preservando espaço de diálogo tanto com Santiago quanto com capitais que celebraram enfaticamente a guinada à direita chilena.​

A posição dos Estados Unidos

O Departamento de Estado dos Estados Unidos felicitou Kast pela vitória e afirmou esperar cooperar para avançar em prioridades compartilhadas, como segurança regional e revitalização da relação comercial. A mensagem, lida como sinal de confiança no compromisso democrático chileno, também foi interpretada como oportunidade para Washington reforçar sua influência em um momento em que o país muda de orientação após quatro anos de um governo de esquerda.​

Especialistas lembram que, do ponto de vista norte-americano, um Chile mais alinhado com políticas de mercado e com uma retórica dura contra o crime e a imigração irregular pode se tornar parceiro importante em iniciativas de combate a redes transnacionais e de contenção da presença de atores extra-regionais na América do Sul. Críticos dessa aproximação temem que uma agenda excessivamente securitária, impulsionada pela convergência entre a Casa Branca e La Moneda, amplie tensões com governos progressistas e aprofunde a fragmentação política continental.​

Opiniões a favor e contra na região

A vitória de Kast é saudada por setores conservadores latino-americanos como correção de rota após anos de protestos, instabilidade institucional e frustração com reformas prometidas pelo campo progressista e não plenamente entregues. Para esses grupos, a nova administração representa a chance de recuperar confiança de investidores, fortalecer a autoridade do Estado frente ao crime organizado e conter o que veem como avanço excessivo de pautas identitárias.​

Em sentido oposto, partidos de esquerda, movimentos sociais e organizações de direitos humanos alertam que a ascensão de Kast pode significar endurecimento de políticas migratórias, aumento da repressão em manifestações e revisão de compromissos em temas como memória histórica, direitos das minorias e proteção ambiental. Críticos afirmam que a combinação de discurso de ordem e reformas liberalizantes tende a aprofundar disparidades sociais e alimentar novos ciclos de contestação de rua, em um país que nos últimos anos se tornou símbolo de mobilização popular contra desigualdades estruturais.​

O impacto geopolítico para a América Latina

A eleição chilena reconfigura o mapa político da América do Sul, que passa a conviver com um mosaico ainda mais fragmentado de governos de esquerda, centro-esquerda, direita liberal e direita radical. Em meio à crise de organismos regionais e a agendas concorrentes de integração, a chegada de Kast tende a fortalecer articulações entre países que defendem maior abertura econômica, acordos de livre comércio e alinhamento com potências ocidentais.​

Do outro lado, governos progressistas podem buscar novas formas de coordenação para responder a uma possível onda de reformas pró-mercado, pressionando por mecanismos de proteção social e ambiental em negociações comerciais e em fóruns multilaterais. A disputa, porém, ocorre em um contexto de baixo crescimento e cansaço dos eleitores com promessas não cumpridas, o que reduz a margem de manobra de qualquer projeto político e aumenta a volatilidade das preferências nas urnas.​

Desafios imediatos de Kast

Ao assumir em março, Kast terá de administrar um país ainda marcado por cicatrizes dos protestos iniciados em 2019, por tensões no processo constituinte e por frustrações acumuladas com o desempenho econômico. A expectativa de seus apoiadores é que rapidez em medidas de segurança e sinais claros de responsabilidade fiscal gerem um choque de confiança capaz de destravar investimentos e reduzir a percepção de desordem.​

Ao mesmo tempo, qualquer passo considerado excessivo na repressão a manifestações ou na flexibilização de direitos trabalhistas tende a gerar forte reação de sindicatos, movimentos estudantis e partidos de oposição, que já se reorganizam para atuar como contraponto no Congresso e nas ruas. Em um cenário regional polarizado e sob olhar atento de vizinhos e dos Estados Unidos, o novo presidente chileno terá de provar que sua promessa de firmeza pode conviver com o respeito às instituições democráticas e aos compromissos internacionais assumidos pelo país.

(*) Com informações das fontes: G1, CNN Brasil, BBC, Gazeta do Povo, Poder360, TMC, Opera Mundi, Observador, Wikipedia.

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