A ordem mundial pós-Guerra Fria está se redefinindo em um ritmo alarmante. O que antes era um pilar de estabilidade regional, a neutralidade dos países escandinavos, hoje se transforma em um sinal inconfundível de que as grandes potências preveem o pior. A decisão da Suécia e da Finlândia de abandonarem décadas de não alinhamento militar e buscarem adesão à Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), ou intensificarem sua cooperação de segurança, é o reflexo mais palpável do medo gerado pela agressão russa na Europa.
O foco da instabilidade reside na postura cada vez mais assertiva e, para muitos, expansionista da Rússia. A invasão da Ucrânia, que já dura mais de dois anos, serviu como um catalisador para a segurança europeia. As incursões aéreas e navais russas em espaços aéreos e marítimos próximos a países da OTAN, incluindo violações de territórios neutros ou fronteiriços como o da Polônia, não são meros acidentes, mas sim táticas de intimidação que testam a resolve e a capacidade de resposta do Ocidente.
A Nova Arquitetura de Defesa Escandinava
Os investimentos maciços em defesa por nações como Suécia, Noruega e Finlândia não são apenas uma atualização militar; eles representam uma mudança fundamental na doutrina de segurança regional. Essas nações, com vastas fronteiras no Ártico e no Báltico, estão se preparando para um cenário de confronto direto que há décadas parecia inconcebível. A Suécia, em particular, que manteve sua neutralidade por mais de 200 anos, está realocando recursos significativos para reativar e modernizar sua infraestrutura militar, incluindo a defesa da estratégica ilha de Gotland.
A Rússia vê a expansão da OTAN como uma ameaça existencial. O Kremlin argumenta que a aliança liderada pelos EUA está avançando em direção às suas fronteiras, desestabilizando o que considera sua esfera de influência. Em resposta, Moscou tem reforçado suas posições militares, especialmente na região do Mar Báltico e no Ártico, aumentando a frequência de exercícios e o desenvolvimento de novas armas. Este ciclo de ação e reação cria uma espiral de tensão militar que é inerentemente perigosa.
OTAN: O Efeito "Todos por Um" e a Posição Americana
O princípio da defesa coletiva da OTAN, consagrado no Artigo 5 de seu tratado, que estabelece que um ataque contra um membro é considerado um ataque contra todos, está no centro da crise. A adesão de novos membros reforça o flanco oriental da aliança e, teoricamente, serve como um poderoso fator de dissuasão. No entanto, o aumento do número de fronteiras compartilhadas com a Rússia também aumenta os pontos potenciais de atrito.
Os Estados Unidos desempenham o papel central, sendo o principal garantidor da segurança da OTAN. A posição de Washington tem sido de apoio irrestrito à Ucrânia e de reforço da aliança. O envio de tropas e equipamentos para a Europa Oriental e o fornecimento contínuo de inteligência e armamento avançado para Kyiv sinalizam um compromisso inabalável em conter a Rússia. Contudo, a polarização política interna dos EUA levanta dúvidas periódicas sobre a sustentabilidade a longo prazo desse compromisso, um fator que Moscou monitora de perto.
O Alerta dos Militares
O pessimismo de oficiais militares de alta patente é um dos indicadores mais preocupantes da situação. Declarações recentes de chefes de defesa suecos e britânicos têm sido notavelmente cautelosas e sombrias sobre o futuro imediato. O alerta é uníssono: a Europa e a OTAN devem se preparar ativamente para a possibilidade de um conflito em grande escala, pois a intenção expansionista da Rússia não parece limitada à Ucrânia. A preparação militar não é apenas para dissuadir, mas para estar pronto para lutar se a dissuasão falhar.
A Ucrânia, apesar de devastada, continua a ser a linha de frente crucial. A resiliência das forças ucranianas, apoiada pelo fornecimento ocidental, tem impedido uma vitória rápida e decisiva da Rússia, transformando o conflito em uma guerra de desgaste que consome recursos e vidas. O resultado desta guerra é visto como um precedente vital: uma vitória russa pode encorajar novas agressões, enquanto uma derrota pode reverter a atual tendência de escalada.
A comunidade internacional, incluindo a ONU e outras organizações multilaterais, tem se mostrado incapaz de frear a escalada. As sanções econômicas, embora significativas, não alteraram o cálculo estratégico de Moscou, e a diplomacia está em um impasse. A Europa se encontra em um precipício, onde a militarização da região escandinava é o penúltimo passo antes de um confronto mais amplo. O despertar do Norte não é um evento isolado, mas o sino de alarme que soa para todo o mundo, sinalizando que a paz, como a conhecíamos, é uma memória que está se esvaindo.
(*) Com informações das fontes: Análises de Segurança e Relações Internacionais, Relatórios de Defesa Europeus e Escandinavos, Declarações Oficiais da OTAN e Governos Membros.