"> Perdas e ganhos

 

Politica - 07/12/2002 - 18:32:49

 

Perdas e ganhos

 

Milton Temer (*) com agências

Foto(s): Divulgação / Arquivo

 

Termina em desencanto a era FHC. Seu grande trunfo - a decantada estabilidade da moeda - ameaça se esfarelar. A inflação está de volta, sem que ninguém possa determinar as dimensões e consequências de sua permanência. De vozes até então incondicionalmente fiéis à atual equipe econômica e ao seu modelo monetarista, eclode o sentimento do pânico. E o que é mais grave: em espaço televisivo até então só dedicado ao oba-oba dos espertos do ‘’mercado’’ e à ridicularização dos que nunca engoliram o cantochão dos apóstolos da financeirização predatória que marcou o período. Mais ainda: dados oficiais confirmam que se a década dos 80 mereceu o epíteto de ‘’perdida’’, algo mais forte terá de ser dedicado à dos 90, dominada pela política econômica dos tucanos - a taxa média de crescimento do PIB foi mais baixa, enquanto a de desemprego bateu recordes. Não vale baixo calão, é claro. Mas o presidente em exercício reúne os seus ministros para fazer balanço e conclui que tudo vai muito bem, sob controle. E se dando ao abuso de até promover propaganda enganosa a propósito do ‘’indiscutível avanço alcançado por nossas instituições democráticas’’, durante seu governo. Omitindo, é claro, a forma perversa e autoritária com que liquidou uma greve de petroleiros no início de seu mandarinato. Com as mesmas justificativas e métodos aplicados por Thatcher, na Inglaterra, contra os mineiros do carvão, para marcar a adesão aos preceitos doutrinários do neoliberalismo. FHC foi mais duro ainda. Vetou a posterior anistia que o Senado aprovou, reintegrando grevistas e dirigentes sindicais demitidos por seus gestores na Petrobrás, como se ele mesmo, professor universitário afastado pela Redentora, não tivesse se beneficiado anteriormente de medida semelhante. E o que tem Luiz Inácio Lula da Silva a ver com isso? Tudo, se estabelecermos comparações conjunturais entre o ponto de partida e o momento atual de suas disputas pela Presidência, e que corresponde exatamente a esse espaço histórico. O que encontraria em janeiro de 90 e o que vai encontrar agora? Qual dos dois cenários lhe seria mais favorável, diante da abertura econômica gerada no governo Collor - no qual estavam dois ilustres tucanos, Hélio Jaguaribe e Celso Lafer - e consolidada no governo FHC? Se é verdade que contaria com muito mais sólidas condições patrimoniais em 90 - um conjunto de empresas do setor público altamente competitivas na área de energia e telecomunicações, e uma dívida mais de 10 vezes menor do que a atual -, estaria diante de uma mídia poderosíssima absolutamente hostil, para além de Forças Armadas, ainda dominadas pelos artigos da Lei de Segurança Nacional, cheias de preconceitos contra o PT. Ou seja: Lula governaria ameaçado por crises institucionais permanentes, artificialmente provocadas, objetivando sua imobilização política e administrativa. Janeiro de 2003 vem com o quadro de cabeça para baixo. A situação patrimonial é dramática. Para além dos brutais serviços e juros da dívida gigantesca, um parque produtivo desnacionalizado, com grandes empresas vivendo dificuldades quase insolúveis. Estado fragmentado, com seus agentes desmotivados. Áreas de energia e telecomunicações em crise, a despeito da prometida panacéia na era das privatizações. Mas em compensação mudaram as condicionantes dos dois agentes potencialmente desestabilizadores de 90. Grandes empresas da mídia eletrônica se fragilizaram financeiramente, criando dependências que antes não tinham ao aporte de novos capitais. Boa oportunidade para o setor público obrigar um comportamento minimamente ético de seus noticiários. Quanto às Forças Armadas, passaram a ter no ‘’inimigo interno potencial’’ de ontem o principal aliado na luta pela recuperação daquilo que os militares viram degradado pela parte que lhes coube na desmontagem do Estado. Ficou evidente o apoio a Lula na batalha eleitoral. Diante dessa mudança de cenário - perdendo nas condições materiais, mas ganhando nas condições subjetivas -, Lula pode ter ficado, paradoxalmente, em melhor posição para tirar conseqüências positivas de sua corajosa avaliação: ‘’A crise é política; mais que econômica’’. E, por decisão política, inverter as prioridades do Orçamento da era tucana - do privilégio aos banqueiros, poucos e poderosos, ao conjunto de assalariados, poderoso porque de muitos. (*) Milton Temer é jornalista (Artigo publicado no Jornal do Brasil em 04/12/2002)

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