Em depoimento à CPI Mista dos Correios, o ex-diretor de Compras da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) Maurício Marinho afirmou que o levantamento de informações que a CPI dos Correios deverá fazer, poderá afetar muitos parlamentares e partidos políticos que, segundo ele, estariam por trás de faturamentos milionários que seriam pagos mensalmente, em comissões, às agências franqueadas pela ECT. Marinho acusou parlamentares de beneficiarem-se de contratos milionários de franquias dos Correios por meio de "laranjas". Segundo ele, "as franquias ajudariam no atendimento ao público, mas os contratos não seriam tão bons para as receitas dos Correios".
No depoimento que presta à CPI Mista dos Correios, Marinho disse ainda que o ministro da Secretaria de Comunicação de Governo, Luiz Gushiken, interfere em contratos de publicidade da ECT e na concessão de patrocínios pela empresa. Ele também denunciou que o banco Bradesco venceu quase todas as licitações de contratos na área de informática.
Marinho enumerou processos que ele acredita que tenham problemas e precisam ser investigados. "Aquisição de kits postais. Aquisição de kits e estações de trabalho para as áreas administrativas da ECT. São milhares de itens. Todos os contratos de obras de engenharia são geridos pela diretoria de Tecnologia. Não há uma obra nesse País que não é gerido por essa diretoria (Tecnologia). Os contratos com empresas terceirizados, todos eles, em sua maioria, coordenado pela diretoria de Tecnologia, essa que dizem que é ligada ao Dr. Silvio (Pereira)".
"Solicito avaliar o contrato que envolve o item seguros, tanto na parte de sistemas, quanto na parte de produtos. Seguros, imagine esse item em 20 mil unidades. Solicito analisar todos os contratos de transporte de carga aéreo, fluvial e de superfície. São milhares de contratos. Não sei quem está por trás disso".
Marinho também solicitou que sejam investigados "caixetas, bicicletas, motocicletas, ou seja, a aquisição de veículos em geral". "Solicito avaliar contratos. Nem consigo imaginar a malha que envolve Correios e Bradesco. A empresa Scorpus, vinculada 100% ao Bradesco, ganhou licitação para fornecer equipamentos em todo o País. E, por último, levantar o envolvimento dos grandes clientes da ECT, que podem atingir muitos de vocês, deputados, hoje ligados a 1050 agências franqueadas. Qual o faturamento dessas empresas. Que pessoas e partidos estão por trás dessas franquias, faturando milhões de reais por mês. Principalmente as de São Paulo. Onde estão sendo feitas as grandes postagens que foram retiradas da ECT e foram para as empresas franqueadas?", questionou o ex-diretor.
O presidente da CPI, deputado Delcídio Amaral, solicitou que todos os documentos citados sejam recolhidos pela assessoria. Na oportunidade, também foi que, após o depoimento de Marinho, seja pedida a suspensão de novas licitações nos Correios.
Contratos
Marinho disse que, no atual governo, os maiores contratos da ECT foram transferidos da área de competência das diretorias para a presidência da empresa. Ele disse que a diretoria que ocupava passou a administrar um orçamento anual de "apenas" R$ 80 milhões, após a mudança de gestão que transferiu a decisão sobre os grandes contratos - especialmente os de publicidade - para o presidente da empresa.
O senador César Borges (PL) perguntou a Marinho qual era o interesse do PT de manter Eduardo Medeiros como diretor de tecnologia até realização de licitação. Marinho disse que havia "voz corrente que havia interesse na permanência do status quo". Marinho afirmou que, no período, havia várias licitações, coordenadas pela diretoria de tecnologia, que poderiam motivar interesses.
O ex-diretor dos Correios declarou que a Casa Civil foi responsável pela nomeação dos seis principais diretores da empresa. Ele informou ainda que a agência de publicidade de Marcos Valério (apontado pelo deputado Roberto Jefferson como operador do "mensalão" pago a deputados do PP e do PL) venceu uma licitação na estatal em agosto de 2004.
Marinho disse ainda que, pouco antes do aparecimento da gravação em que foi flagrado recebendo R$ 3 mil de uma empresa privada, o PT vinha se mobilizando para evitar a perda da diretoria de Tecnologia da ECT para o PTB.
Pedido de segurança
Marinho pediu, na manhã de hoje, segurança e acrescentou que está sendo perseguido. "Peço, pelo amor de Deus, pela segurança da minha família. Fui seguido mais de uma vez. Peço por segurança", solicitou Marinho emocionado.
Ele afirmou que foi procurado pelo delegado Luiz Zampronha e que falaria o que os deputados e senadores lhe perguntarem. "Mas necessito de segurança, fui seguido mais de uma vez. Até o momento, não reconheci a segunda pessoa que fez a gravação. Quem está por trás de tudo isso", apelou.
Marinho diz que receber dinheiro não é ato corrupto
O ex-diretor de Compras da ECT disse que não considera incorreto o fato de ter recebido R$ 3 mil de uma empresa privada a título de "prestação de assessoria". "Aquilo não é um ato corrupto", disse. Ele foi flagrado enquanto embolsava a propina e revelava ao interlocutor um suposto esquema de corrupção instalado pelo PTB em estatais.
O deputado Onyx Lorenzoni (PFL-RS), que interrogou Marinho, discordou da resposta e afirmou que um servidor público não pode usar o cargo para receber dinheiro de empresa privada. Lorenzoni chegou a afirmar que o depoimento de Marinho é mais cínico que ele teve a oportunidade de assistir.
Depoimento é interrompido e advogados abandonam Marinho
O depoimento de Marinho foi interrompido por volta das 10h50 para que os seus advogados conversassem com ele. Os advogados do ex-diretor do Correios solicitaram a palavra ao senador Maguito Villela (PMDB-GO), que preside a sessão. O senador não cedeu a palavra aos advogados, mas a senadora Heloísa Helena (PSOL-AL) conversou com eles e comunicou aos parlamentares que os advogados estavam ameaçando abandonar o caso porque Marinho não estaria falando a verdade. O deputado José Eduardo Cardoso (PT-SP) advertiu que os advogados não podem intervir no depoimento. "Depois, alguém poderia requerer a nulidade do ato", afirmou.
"Os advogados disseram claro: o depoente está mentindo. Assim sendo, eles não podem ser parte dessa farsa", disse a senadora. "Agora se (ele) mente para o advogado, imagine como nos sentimos na Comissão Parlamentar", completou.
Minutos depois, o fato antecipado pela senadora aconteceu. Os advogados Sebastião Coelho da Silva, Ricardo Baitello e Iara Daher abandonaram a defesa de Marinho e justificaram a iniciativa dizendo que ele estava "faltando com a verdade" e "sonegando informações".
Para hoje está previsto que os parlamentares de vários partidos e servidores federais em greve realizem um ato contra a corrupção, com a lavagem da rampa do Congresso Nacional.
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