Consumo sustentável e cidadania

 

Opinião - 07/03/2003 - 12:03:16

 

Consumo sustentável e cidadania

 

Paulo Henrique Martinez (*) .

Foto(s): Divulgação / Arquivo

 

O Idec, Instituto de Defesa do Consumidor, respeitada organização não governamental empenhada na inibição de impactos negativos e perversos nas relações de mercado, desencadeou oportuna e necessária campanha pelo consumo sustentável de produtos e serviços. O sucesso dessa ação construtiva para remodelar comportamentos individuais e coletivos requer a mudança de hábitos, atitudes e valores sociais há tempos enraizados no Brasil, tornando o desafio ainda maior. No século XX, historiadores como Sérgio Buarque de Holanda e Caio Prado Jr. explicitaram a lentidão e as dificuldades de efetivação nas mudanças de padrões culturais historicamente estabelecidos. A iniciativa do Idec adquire sentidos e méritos engrandecedores que merecem atenção de toda sociedade. O consumo sustentável pode e deve ser estabelecido a partir de uma nova relação entre consumidores e empresas, significando importante passo rumo a uma sociedade mais autônoma e responsável pelo seu próprio destino. O consumo sustentável incorpora aos hábitos e comportamentos do consumidor, além da atenção a preço e qualidade, a observação rigorosa quanto à procedência e formas de obtenção dos produtos e serviços oferecidos e disponíveis no mercado. A mudança de atitudes do consumidor tem alcance maior do que comumente se imagina e pode, devido ao seu poder de investimento e de compra, contribuir para alterar modelos da própria produção de bens e serviços. O consumo sustentável é realizado por uma postura consciente e atenta aos produtos e serviços que respeitem o meio ambiente, assegurando a exploração não-predatória de recursos naturais e a redução dos volumes de poluição e de lixo gerados pela produção e o consumo. A sustentabilidade passa a ser chave nas duas pontas da atividade econômica e na vida social das pessoas, empresas e da administração pública, principal produtora e consumidora de bens e serviços em nossa sociedade. A informação, a educação ambiental e a consciência dos direitos do consumidor formam o conjunto e a base das novas atitudes em busca do consumo e da produção sustentáveis. Experiências semelhantes, propondo o envolvimento e a mobilização dos diversos segmentos sociais, empresas e governos, já são desenvolvidas para a redução da violência, o combate à dengue e às drogas e animam o projeto Fome Zero do governo federal. As práticas de consumo sustentável tornam-se mais efetivas e eficazes com a atuação das instâncias de governo em todos os níveis - municipal, estadual e federal - e das três esferas de poder - Legislativo, Judiciário e Executivo. As inúmeras combinações possíveis entre fiscalização minuciosa, regulamentação específica da atuação de empresas e órgãos públicos, observância estrita da legislação em vigor e o desenvolvimento de políticas públicas articuladas e de incentivo, são propulsoras valiosas na consecução dos meios e fins do consumo e da produção sustentáveis. Governo e sociedade podem, então, ser parceiros na gestão e construção do futuro. O foco das ações de governo amplia-se, ao “fazer para” agrega-se o “fazer com” a população. Uma diretriz de cooperação que tomou corpo ao longo da década de 1990, aglutinou adeptos e adquiriu alguma expressão nos governos de FHC e comparece na agenda política do governo Lula como estratégia na promoção de reformas e de mudança social programadas. A apatia política da maioria dos brasileiros, alvo da análise de tantos historiadores, pode ceder espaço ao desenvolvimento da cidadania sob formas contemporâneas de exercício e expressão. Resta saber, e aferir, o quanto novas relações entre a cultura e a vida política podem contribuir para a transformação do Brasil em uma sociedade também nova. O consumo sustentável pode constituir-se em bom indicador dessa mudança social. (*) Paulo Henrique Martinez é professor no Departamento de História da Unesp, Assis/SP

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