Estatisticamente é cada vez maior o número de mulheres que desiste de ter o segundo filho. Basta ver a taxa de fecundidade da mulher brasileira que, segundo o IBGE, baixou de 2,37, em 1995, para 2,2 no ano passado. Em alguns estados da região sudeste e sul, o índice é ainda mais baixo, quase se equiparando ao de países europeus. Estatísticas à parte, o que vem chamando a atenção de pais e educadores são as conseqüências que essa falta de relação fraternal pode trazer para a criança - leia-se um grande sentimento de ego-centrismo - e até para a sociedade.
Para a psicóloga Maria Tereza Maldonado, a opção pelo filho único deve-se, principalmente, a fatores como a crescente inserção da mulher no mercado de trabalho, a dificuldade de contar com uma infra-estrutura adequada para que as crianças fiquem bem cuidadas enquanto os pais trabalham, e o compromisso não só emocional mas também financeiro de criá-las. Foi o lado financeiro que pesou na opção da professora universitária Mariana Alencar na hora de planejar uma família pequena. “O custo de vida está altíssimo atualmente. Não tenho condições de bancar duas escolas, planos de saúde... Quero o melhor para meu filho. Por isso, eu e o Sérgio optamos por ter apenas um”, conta Mariana, que é filha e neta única.
A copeira Patrícia Rabello, mãe de Thays, de 10 anos, também não pode arcar com as despesas de um segundo filho. “Meu marido até quer mais uma criança mas eu não tenho coragem. Trabalho em período integral para ajudar a pagar todas as contas”, desabafa. “Estou também com 29 anos, minha filha já está mais independente, não teria paciência para começar tudo de novo”, confessa. Muitas vezes, a chegada do irmãozinho vai sendo adiada por tanto tempo que simplesmente acaba não acontecendo. Com a tradutora Ana Paula Oliveira, mãe de Thiago, 22 anos, foi assim. Quando o menino tinha apenas seis meses, a tradutora ficou grávida de novo.
Dividida entre o neném, o trabalho e o marido, Ana optou pelo aborto, adiando a segunda gravidez para um momento mais oportuno, o que não aconteceu. “Se arrependimento matasse... Acho lindo quando vejo uma família grande. Era louca para ter mais um filho mas fiquei esperando melhorar minha carreira e, quando vi, o Thiago já estava com 12 anos. Perdi totalmente o pique”, lembra, com remorso. “Hoje, me sinto muito sozinha.
Eu me divorciei e meu filho é minha única família. O pior é que o Thiago se tornou um rapaz muito sozinho e egocêntrico, ele literalmente se fecha no quarto nos raros momentos em que está em casa”, lamenta.
Segundo a psicóloga clínica Maria Tereza Maldonado, o filho único não é necessariamente uma pessoa egocêntrica ou problemática. Os pais dessa criança também não são necessariamente superprotetores ou superexigentes.
Cada organização familiar tem características e desafios próprios, que precisam ser enfrentados para se construir um lar harmônico, em que a criança se desenvolva bem.
No caso do filho único, de acordo com a psicóloga, falta a relação fraterna em que, por meio de brigas, disputas, brincadeiras e outros momentos de convívio, vão se formando as noções básicas de relacionamento entre pares, meios de resolver impasses e conflitos, além de hábitos de partilha e de ajuda recíproca.
No entanto, algumas pessoas, mesmo tendo irmãos, crescem egocêntricas, não respeitando as necessidades dos outros e impondo seus desejos. Na opinião da terapeuta, a questão é como estimular, no filho único, o desenvolvimento dessa capacidade de levar os outros em consideração, de ter empatia, compreensão e generosidade.
Maria Tereza sugere estimular desde cedo o convívio com outras crianças, criando condições para o desenvolvimento de laços fortes de amizade, para que o filho único possa ter a oportunidade de, ao longo da vida, criar “amizades fraternas”, como uma rede de “amigos-irmãos”. Portanto, criar amplas oportunidades de contato do filho único com outras crianças da própria família, da escola ou da vizinhança é um caminho essencial para a construção da segurança em sua capacidade de se comunicar, de se relacionar, de compartilhar bons momentos de brincadeira e de criar recursos para resolver impasses e conflitos que inevitavelmente surgirão no dia-a-dia.
“É um entra e sai de crianças aqui. O importante é educar filhos, únicos ou não, como se estivesse cuidando de uma plantinha.
Carinho, atenção, proteção e limites na dose certa farão essa criança desabrochar com a certeza de que veio ao mundo para ser um cidadão consciente, solidário e atuante.
|