Em um dia de turbulência no mercado financeiro, a moeda norte-americana fechou acima de R$ 4 pela primeira vez desde a criação do real. O dólar comercial subiu R$ 0,073 (1,83%) e encerrou esta terça-feira (22) vendido a R$ 4,054. O recorde anterior correspondia a 10 de outubro de 2002, quando a cotação tinha fechado em R$ 3,99.
O dólar operou acima de R$ 4 ao longo de toda a sessão. Na máxima do dia, por volta das 14h30, chegou a ser vendido a R$ 4,061. A divisa acumula alta de 11,76% apenas em setembro e de 52,47% em 2015.
Diferentemente de ontem (21), quando vendeu US$ 3 bilhões das reservas internacionais com compromisso de recompra, o Banco Central não interveio diretamente no mercado de câmbio hoje. O órgão apenas continuou com a rolagem (renovação) dos leilões de swaps cambiais, que equivalem à venda de dólares no mercado futuro.
Até agora, o BC rolou US$ 6,74 bilhões do lote total de US$ 9,46 bilhões, equivalente a 71% do total. Nos leilões de rolagem, o BC não vende contratos novos de swap cambial. Apenas adia o vencimento de contratos leiloados nos meses anteriores.
Também contribuiu para a alta do dólar o cenário internacional. Nesta terça-feira (22), integrantes do Federal Reserve (Fed), Banco Central norte-americano, deram indicações de que o banco pode aumentar os juros dos Estados Unidos antes do fim do ano.
Na semana passada, o Fed decidiu adiar o aumento dos juros básicos da maior economia do planeta, que estão entre 0% e 0,25% ao ano desde o fim de 2008. Segundo o órgão, uma elevação neste momento poderia trazer riscos para a economia mundial.
Altas de juros nos Estados Unidos pressionam a cotação do dólar em todo o planeta. Taxas maiores incentivam os investidores a retirar recursos de países emergentes, como o Brasil, para aplicarem em títulos do Tesouro norte-americano, considerados a aplicação mais segura do planeta.
Insegurança
A preocupação com o rumo do país tem impulsionado a cotação da divisa. Atualmente, o Governo de Dilma Rousseff empreende, de forma atribulada com muitas idas e vindas nas decisões, uma política de austeridade e um necessário, segundo muitos especialistas, ajuste nas maltratadas e endividadas contas públicas. No entanto, há risco certo de que novas agências de qualificação rebaixem a nota de crédito no Brasil já que no início do mês, a agência Standard & Poors rebaixou a nota brasileira e retirou o selo de bom pagador do país. Agora, especialistas concordam que as agências Fitch e Moody seguirão o mesmo caminho.
Tudo indica que a volatilidade entre o dólar e o real continue nas próximas semanas. Ninguém pode se atrever, no entanto, a calcular quanto valerá o dólar no fim do ano, mas a tendência é que oscile em torno dos quatro e cinco reais por dólar, de acordo com a maioria dos analistas.
Nas últimas semanas, o mundo político e econômico brasileiro foi sacudido por crises ininterruptas: especulou-se a destituição do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, o arquiteto de todo o plano de ajuste; depois, houve especulações sobre a demissão do ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante. Tudo isso reflete a instabilidade de um Governo fustigado por múltiplas forças.
A situação da presidente piora a cada dia. "Ela está cada vez mais isolada, o que impossibilita a adoção de medidas muito importantes para reativar a economia e cria esse cenário de incerteza. Com esse panorama é difícil que a taxa de câmbio reverta a tendência de alta", explica o economista-chefe da Gradual Investimentos, André Guilherme Perfeito.
O economista salienta, no entanto, que a situação da desvalorização do real ainda não é tão preocupante porque o Brasil possui uma reserva de divisas relativamente boa, de 370 bilhões de reais. "Entre os Brics, só temos menos reservas que os chineses", acrescenta.
Quem ganha e quem perde
Ainda que o real mais fraco pressione a inflação com o aumento do preço dos importados, reduzindo o poder de compra dos brasileiros, a moeda desvalorizada beneficia a balança comercial do país e facilita as exportações. A lógica é simples, os preços dos produtos ficam mais competitivos no exterior e a demanda pelos produtos brasileiros sobem.
"Essa valorização não pode ser vista apenas sob uma perspectiva negativa. Um dólar mais caro ajuda no equilíbrio da balança comercial que vem sofrendo com a desaceleração da economia da China (o principal comprador do Brasil) e com a queda global dos preços das commodities", afirma.
O economista explica também que os turistas brasileiros vão começar a buscar mais destinos nacionais o que fará que o dinheiro circule mais no turismo local. Com um dólar mais caro, uma viagem para o exterior pesará mais no bolso dos cidadãos. "Os brasileiros estavam deixando uma média de 2 bilhões de reais no exterior por mês, mas agora esse valor deve cair bastante", explica Perfeito.