Maioria dos ministros do TCU deve rejeitar contas de Dilma
Da Redação com agências
Foto(s): Divulgação / Valter Campanato / Abr
O relator do processo no TCU, ministro Augusto Nardes, recebe do advogado-Geral da União, Luís Inácio Lucena Adams, justificativas sobre as contas do governo de 2014
Mesmo sem analisar a defesa do governo para as últimas irregularidades apontadas, como a abertura de créditos sem autorização do Congresso Nacional, a maioria dos ministros do TCU (Tribunal de Contas da União) já tem uma posição formada: tende a rejeitar as contas da presidente Dilma Rousseff relativas a 2014. Independentemente das justificativas apresentadas para os diversos tipos de "pedaladas fiscais", os ministros do tribunal devem reprovar as contas pelo "conjunto da obra", como descreveu um deles. Eles avaliam que as contas do governo estão fora do controle.
A grave crise econômica do governo e a possibilidade de rejeição das contas da presidente, o que abriria o caminho para um pedido de impeachment na Câmara dos Deputados, está despertando o interesse de governos estrangeiros e de agências internacionais de risco. A Embaixada dos Estados Unidos no Brasil já teve audiência no TCU para levantar informações sobre a situação das contas da Presidência da República. A agência de classificação de riscos Fitch marcou audiência para os próximos dias com o relator das contas, ministro Augusto Nardes, para buscar informações sobre as contas do governo.
Na último quarta-feira (9), a nota do Brasil foi rebaixada pela agência Standard and Poor's de "BBB-" para "BB+", com perpectiva negativa. O principal motivo do rebaixamento do rating do Brasil teve como principal motivo a apresentação de uma proposta de Orçamento da União para 2016 com deficit de R$ 30,5 bilhões, o equivalente a 0,3% do PIB (Produto Interno Bruto). Não será novidade para o governo o rebaixamento do país também pela agência Fitch num futuro próximo.
A equipe técnica do governo ainda não iniciou uma análise profunda da defesa apresentada pelo governo na última sexta-feira (11), mas considera "frágil" os argumentos utilizados pelo governo e tornados públicos pela AGU (Advocacia Geral da União). O advogado-geral da União, Luis Inácio Adams, ponderou que o governo desenvolveu uma dinâmica que já havia sido admitida pelo Congresso e pelo TCU em anos anteriores. "O que queremos é que a jurisprudência seja reconhecida”, argumentou Adams.
Os argumentos apresentados pelo governo em julho, depois de encerrado prazo para as explicações sobre a primeira leva de "pedaladas", também não convenceram a equipe técnica do tribunal nem os seus ministros. O consenso está formado no tribunal, mas alguns ministros esperam uma forte pressão por parte do governo nas próximas semanas para reverter essa posição. O possível agravamento da crise econômica, com a queda da credibilidade do governo, deverá ser o novo argumento dos ministros de estado que devem procurar o tribunal.
Previdência
O rombo da Previdência Social, que cresce a cada ano, é outra preocupação dos ministros do TCU. Auditoria aprovada no final do ano passado, apontou o problema e sugeriu medidas para enfrentá-lo. O tribunal apontou um déficit de R$ 112,6 bilhões em 2013. As despesas do governo com a Previdência Social subiram de R$ 291 bilhões em 2009 para R$ 446 bilhões em 2013 – um crescimento médio de 11% ao ano, contra uma inflação média anual de 6%.
A tendência é que a situação piore nos próximos anos. Segundo dados do IBGE ( Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a parcela da população que tem acima de 65 anos de idade, atualmente, representa 7,6% do total. Esse percentual deverá atingir 10% em 2022 e de 20%, em 2046 – o que certamente levará ao aumento do déficit previdenciário, caso medidas de ajuste no sistema vigente não sejam adotadas em tempo hábil, segundo conclusão da auditoria. Ministros do TCU defendem a elevação da idade mínima para aposentadoria para, no mínimo, 65 anos de idade para o homem e 60 para as mulheres.
A proposta de Orçamento para 2016 confirma os prognósticos do TCU. O projeto de lei orçamentária estima em R$ 491 bilhões a totalidade dos benefícios pagos pela Previdência Social. Serão mais mais R$ 52,2 bilhões de despesas para pagamento de aposentadorias, pensões e auxílio-doença e outros pequenos auxílios.
O saldo negativo entre receitas e despesas previdenciárias será de R$ 124,9 bilhões, O resultado reflete a combinação de forte crescimento das despesas com queda de receitas.
Tendências
Aquilo que nasceu como manobra para beneficiar o governo no TCU pode se tornar um caso clássico de feitiço que se volta contra o feiticeiro. Renovado duas vezes, o prazo concedido ao Planalto para que se defendesse das acusações de charlatanismo fiscal esquentou o caldeirão em vez de esfriar.
Dois ministros do TCU ouvidos (Blog do Josias) disseram que a tendência de rejeição da prestação de contas do governo referente a 2014 não se alterou. Na definição de um dos ministros, essa tendência é “clara”. Nas palavras do outro, é “muito nítida”. Percebe-se pelas explicações de ambos que o feitiço dos prazos saiu pela culatra.
A demora manteve o tema no noticiário, popularizando-o, disse um dos julgadores. Balanços fiscais não costumam seduzir as manchetes. Hoje, só se fala em 'pedaladas'. Como poucas vezes na sua história, o TCU se tornou alvo do interesse coletivo, completou. Qualquer decisão que possa ser vista como manobra levará à desmoralização do TCU e dos seus membros, afirmou o outro ministro.
Preparada pela Advocacia-Geral da União, a última peça da defesa do governo foi entregue nesta sexta-feita (11). São mais de mil páginas. Serão analisadas pelos auditores do TCU. Os ministros acreditam que a defesa não apresentou nenhum elemento capaz de alterar a convicção do corpo técnico do órgão a favor da rejeição das contas.
Ambos previram que o relator do processo, ministro Augusto Nardes, deve endossar o posicionamento da equipe técnica, votando pela rejeição das contas. E o voto do relator deve ser acompanhado pela maioria. Órgão auxiliar do Congresso, o TCU remeterá seu parecer para os parlamentares, que têm a atribuição de julgar as contas do Executivo. Uma reprovação levaria água para o moinho do impeachment.
Entre as acusações, a que mais preocupa é a de que foram editados decretos ampliando ilegalmente os gastos públicos em ano eleitoral, sem a anuência do Congresso. Essa manobra é mais preocupante porque os decretos foram assinados por Dilma. No caso das 'pedaladas' —espécies de saques a descoberto em bancos públicos— tenta-se transferir a culpa para Arno Augustin, ex-secretário do Tesouro.
Um dos ministros disse estar “desalentado” com duas das teses esgrimidas pela defesa do governo. Numa, alega-se que governos anteriores, entre eles o de FHC, recorreram aos mesmos expedientes. Noutra atribuiu-se o malabarismo fiscal à virada repentina e imprevisível da economia. O ministro ironizou: até um marciano é capaz de notar que a atual instabilidade econômica foi uma obra lenta e bastante previsível.