A LEI Nº 9.615, DE 24 DE MARÇO DE 1998 (Lei Pelé) dispõe:
"Art. 42. Pertence às entidades de prática desportiva o direito de arena, consistente na prerrogativa exclusiva de negociar, autorizar ou proibir a captação, a fixação, a emissão, a transmissão, a retransmissão ou a reprodução de imagens, por qualquer meio ou processo, de espetáculo desportivo de que participem. (Redação dada pela Lei nº 12.395, de 2011)."
Logo, não é cada jogador individualmente que negocia a transmissão de sua imagem durante a prática desportiva, mas a entidade desportiva a qual é vinculado.
"§ 1º Salvo convenção coletiva de trabalho em contrário, 5% (cinco por cento) da receita proveniente da exploração de direitos desportivos audiovisuais serão repassados aos sindicatos de atletas profissionais, e estes distribuirão, em partes iguais, aos atletas profissionais participantes do espetáculo, como parcela de natureza civil. (Redação dada pela Lei nº 12.395, de 2011)."
É importante frisar que antes da Lei 12.395/2011 o percentual repassado aos atletas era em regra de 20% e não 5%. Artigo publicado pelo portal de notícias UOL informa que jogadores famosos como Dagoberto e Denilson impetraram ações judiciais contra seus clubes a respeito do Direito de Arena. (entenda o caso por meio deste link)
A confusão se deu porque os clubes, antes da vigência da Lei 12.395/2011, através de negociação coletiva com os sindicatos, fixaram o percentual mencionado em 5% e não 20%. No entanto, o Tribunal Superior do Trabalho entende que o referido valor determinado no dispositivo legal é o menor possível, de modo que a convenção coletiva só poderá aumentá-lo, nunca diminuí-lo:
RECURSO DE REVISTA. DIREITO DE ARENA. CONTRATO DE TRABALHO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.615/1998. REDUÇÃO DO PERCENTUAL POR MEIO DE ACORDO JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. Discute-se a possibilidade de redução do percentual referente ao direito de arena, por meio de acordo judicial. Segundo a jurisprudência desta Corte, o percentual de 20%, estabelecido no art. 42, § 1º, da Lei nº 9.615/1998 para o cálculo do direito de arena dos contratos realizados na vigência desta Lei, é o percentual mínimo assegurado que será distribuído aos atletas profissionais, pelo que não poderá ser reduzido por acordo judicial nem por negociação coletiva. Precedentes. Decisão recorrida em sintonia com a atual jurisprudência desta Corte. Recurso de revista de que não se conhece. (...) (TST - RR: 9777720105040010, Relator: Kátia Magalhães Arruda, Data de Julgamento: 10/06/2015, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 12/06/2015)
"§ 2º O disposto neste artigo não se aplica à exibição de flagrantes de espetáculo ou evento desportivo para fins exclusivamente jornalísticos, desportivos ou educativos, respeitadas as seguintes condições: (Redação dada pela Lei nº 12.395, de 2011).
I - a captação das imagens para a exibição de flagrante de espetáculo ou evento desportivo dar-se-á em locais reservados, nos estádios e ginásios, para não detentores de direitos ou, caso não disponíveis, mediante o fornecimento das imagens pelo detentor de direitos locais para a respectiva mídia; (Incluído pela Lei nº 12.395, de 2011).
II - a duração de todas as imagens do flagrante do espetáculo ou evento desportivo exibidas não poderá exceder 3% (três por cento) do total do tempo de espetáculo ou evento; (Incluído pela Lei nº 12.395, de 2011).
III - é proibida a associação das imagens exibidas com base neste artigo a qualquer forma de patrocínio, propaganda ou promoção comercial. (Incluído pela Lei nº 12.395, de 2011)."
A grande controvérsia do § 2º se relaciona com o conceito de fins jornalísticos, desportivos ou educativos.
Ao menos o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro tem dado uma interpretação não restritiva ao conceito de fim jornalístico. Recentemente, considerou que o portal de notícias UOL tem o direito de veicular em seu sítio eletrônico vídeos com duração igual ou inferior a 3% do evento desportivo. Entendeu-se que o portal tem a função jornalística como finalidade primordial:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NA APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER E NA AÇÃO CAUTELAR. EXCLUSIVIDADE NA TRANSMISSÃO DOS JOGOS DO CAMPEONATO BRASILEIRO. DIREITO DE INFORMAÇÃO. LEI PELÉ. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 42, PARÁGRAFO 2º, DA LEI Nº 9615/98. É INCONTROVERSO QUE OS VIDEOS DISPONIBILIZADOS PELO UOL NÃO ULTRAPASSAM A DURAÇÃO MÁXIMA QUE TRATA A LEI (3% DO TOTAL DO TEMPO PREVISTO PARA O ESPETÁCULO ESPORTIVO). A FUNÇÃO JORNALISTICA TEM COMO FINALIDADE PRIMÁRIA A INFORMAÇÃO. O SÍTIO APELADO REPRESENTA UM IMPORTANTE VEÍCULO DE DIVULGAÇÃO E INFORMAÇÃO. A existência de publicidade ou de patrocinadores gerais de um portal ou sítio da internet não retira o caráter jornalístico das informações e das matérias nele apresentadas ou exibidas. Os próprios jornais impressos contêm anunciantes e publicidade em várias de suas páginas, sem que se pretenda, com isso, retirar o caráter jornalístico das informações neles encontradas. É incontroverso que os vídeos dos flagrantes de espetáculo não ultrapassam a duração máxima que trata a lei. De fato o que se viu é que o Apelado (UOL) atendeu às exigências do § 2º do art. 42 da Lei nº 9.615/98, seja porque se limitou a exibir flagrantes dos jogos sempre abaixo do percentual indicado (3%), seja porque os vídeos tinham caráter jornalístico, limitando-se a exibir os gols e/ou os lances principais de cada jogo, acompanhados de comentários resumidos sobre o ocorrido. O direito de arena previsto no art. 42 da Lei nº 9.615 /98 não é absoluto, na medida em que o próprio dispositivo legal limita o seu exercício, livrando de proteção autoral a exibição de flagrantes de espetáculo desportivo, desde que para fins exclusivamente jornalísticos ou educativos. Inexistindo no acórdão qualquer dos defeitos constantes do elenco do art. 535 do CPC, isto é obscuridade, contradição ou omissão, restam improsperáveis os embargos declaratórios opostos. Não provados nem verificados os defeitos aduzidos. RECURSOS IMPROVIDOS. (TJ-RJ - APL: 00885863520058190001 RJ 0088586-35.2005.8.19.0001, Relator: DES. CLAUDIO DE MELLO TAVARES, Data de Julgamento: 26/02/2014, DÉCIMA PRIMEIRA CÂMARA CIVEL, Data de Publicação: 01/04/2014 13:48)
NATUREZA JURÍDICA DA COTA-PARTE DE PARTICIPAÇÃO DO TRABALHADOR ATLETA PROFISSIONAL NO DIREITO DE ARENA
Há dois períodos distintos a serem analisados. Antes da Lei nº 12.395, de 2011, a jurisprudência dominante entendia que a cota-parte de participação do trabalhador atleta profissional no direito de arena tinha natureza jurídica de gorjeta. Portanto, aplicar-se-ia a súmula 354 do TST:
"GORJETAS. NATUREZA JURÍDICA. REPERCUSSÕES (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003
As gorjetas, cobradas pelo empregador na nota de serviço ou oferecidas espontaneamente pelos clientes, integram a remuneração do empregado, não servindo de base de cálculo para as parcelas de aviso-prévio, adicional noturno, horas extras e repouso semanal remunerado."
Todavia, o § 1º do art. 42 da Lei Pelé, com a redação dada pela Lei nº 12.395, de 2011, é claro ao afirmar que a parcela comentada tem natureza civil. Portanto, após referido diploma normativo, não há como sustentar-se a posição de natureza remuneratória. Esta é inclusive a posição do Colendo Tribunal Superior do Trabalho:
RECURSO DE REVISTA. 1. PRELIMINAR DE NULIDADE POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. 2. DIREITO DE ARENA. NATUREZA JURÍDICA. 3. MULTAS DOS ARTS. 467 E 477 DA CLT. No tocante à natureza jurídica da cota-parte de participação do trabalhador atleta profissional no direito de arena, a jurisprudência dominante tem-na considerado como remuneratória, por analogia com as gorjetas e outras verbas pagas por terceiros ao empregado em decorrência do contrato de trabalho. O enquadramento dessa verba no tipo jurídico da remuneração resultaria da circunstância de o texto original do art. 42, § 1º da Lei n. 9.615/98 não ter explicitado a natureza jurídica da vantagem repassada parcialmente aos atletas a partir do preço acertado com as redes de transmissão dos espetáculos desportivos. A omissão da lei desportiva específica faria incidir, por corolário, a regra geral celetista relativa aos pagamentos habituais feitos por terceiros ao empregado em vista do trabalho por este prestado no contexto da relação de emprego - regra geral concernente à parcela remuneração, inferida pela jurisprudência do art. 457, caput, da CLT, conforme Súmula 354 do TST. Entretanto - tal como ocorrido com a cessão do direito de imagem -, a inserção, na Lei Pelé, de novo dispositivo (§ 1º do art. 42), por meio da Lei n. 12.395, de 2011, pode introduzir alteração na linha interpretativa até então dominante. É que o novo preceito legal enquadra, explicitamente, como parcela de natureza civil, a participação do atleta trabalhador na cota-parte do direito de arena explorado pelo empregador, cujo montante é pago pelas entidades mass media envolvidas. Determina ainda o novo texto legal que serão repassados aos sindicatos de atletas profissionais, sendo por estes distribuídos aos atletas participantes do espetáculo (art. 42, § 1º, Lei Pelé, em sua nova redação). Na hipótese, os fatos que deram origem à lide ocorreram na vigência do texto original do art. 42, § 1º, da Lei Pelé, o que confere natureza jurídica salarial à cota-parte de participação do trabalhador atleta profissional no direito de arena. Recurso de revista não conhecido. (TST - RR: 1743006620035010006, Relator: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 17/09/2014, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 19/09/2014)
* Jean de Magalhães Moreira - Jurista - Colatina (ES) - Um apaixonado pelo Direito do Trabalho. Trabalha como técnico judiciário na Justiça Federal de Colatina/ES.
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