“O “Minha Casa Minha Vida 3” foi gestado da mesma forma que os anteriores: um programa que atende sobretudo aos interesses do setor privado e não da sociedade como um todo. Se isso não for corrigido, perderemos uma vez mais a oportunidade de utilizar os recursos vultosos do programa para reorganizar as cidades em benefício de todos.
Uma das principais críticas feitas aos MCMV 1 e 2 é a localização dos empreendimentos em bairros periféricos, distantes da malha dotada de infraestrutura e mercado de trabalho, agravando problemas urbanos e sociais já insustentáveis em nossas cidades.
A decisão sobre a localização desses empreendimentos não pode ser dos construtores, dos proprietários de terra ou dos invasores, sob pena de potencializarmos a crise habitacional e a mobilidade urbana.
O Estado não pode abrir mão de seu papel de planejador do uso e ocupação do solo de nossas cidades. Os prefeitos, ao receberem verbas do Minha Casa Minha Vida, devem pensar no futuro de suas comunidades, não fechar os olhos para a proliferação de anomalias urbanas, seduzidos por inaugurações imediatistas de obras com a presença de altas autoridades.
Sem planejamento amplo e bom uso dos mecanismos previstos no Estatuto das Cidades para coibir a especulação imobiliária, os subsídios do Minha Casa Minha Vida beneficiam mais os latifundiários urbanos que a população de baixa renda. Agora, com a ampliação das faixas de renda que podem ter acesso ao programa, precisamos ficar atentos para a lógica do mercado imobiliário não prevalecer sobre os interesses sociais.
"Habitação não é só o lugar onde você mora, é um conjunto de coisas que fazem você sobreviver, inclusive o trabalho”, disse com muita propriedade o recém falecido arquiteto João Filgueiras Lima, o Lelé.
Um dos mais talentosos arquitetos do País, com uma obra predominantemente voltada para projetos públicos de cunho social, Lelé foi convidado em 2011 pela presidente Dilma Rousseff para propor uma nova solução para o Minha Casa, Minha Vida. O projeto piloto envolvia duas regiões carentes de Salvador. Os prédios utilizariam estrutura mista metálica com argamassa armada, racionalizando a produção. A mão de obra local seria treinada e utilizada nas obras. Mais do que moradias, seriam construídas comunidades com creche, escola, áreas de lazer e comércio.
A burocracia, aliada a interesses privados, impediu que o projeto sonhado pela presidente saísse do papel. A mesma burocracia que tem ficado atônita e passiva com os seguidos casos de construções com problemas estruturais, inclusive com ameaças de desabamentos; denúncias de superfaturamento; transformação dos conjuntos habitacionais em condomínios fechados e expulsão de moradores por milícias.
Mais do que quantidade, o Minha Casa Minha Vida precisa de qualidade”.
Haroldo Pinheiro, presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR)
