Ameaça de tirar Facebook do ar revela conflito entre lei e força de redes sociais

 

Informática - 04/10/2013 - 09:26:49

 

Ameaça de tirar Facebook do ar revela conflito entre lei e força de redes sociais

 

Da Redação com BBC Brasil

Foto(s): Divulgação / Arquivo

 

Alguns juízes, talvez despreparados para a função, não analisam as causas de suas decisões e, para favorecer um, prejudicam outros que podem ser dezenas, centenas, milhares ou, nesse caso, milhões

Alguns juízes, talvez despreparados para a função, não analisam as causas de suas decisões e, para favorecer um, prejudicam outros que podem ser dezenas, centenas, milhares ou, nesse caso, milhões

A determinação de um juiz de São Paulo de que o Facebook tirasse do ar posts ofensivos sob pena de que, em caso de descumprimento, todo o site fosse retirado do ar no Brasil, mostra um conflito entre leis nacionais para a internet e o caráter global das redes sociais, alertam observadores internacionais ouvidos pela BBC Brasil.

Na quarta-feira, o juiz Régis Rodrigues Bonvicino, da 1ª Vara Cível do Foro Regional de Pinheiros, em São Paulo, deu ao Facebook 48 horas para retirar do ar 22 postagens de seguidores da apresentadora de TV Luize Altenhofen.

Ela havia se envolvido em uma disputa judicial com um vizinho e seguidores dela na mídia social fizeram comentários considerados ofensivos contra a outra parte no processo, o dentista Eudes Gondim Júnior.

Luize Altenhofen havia se envolvido em uma disputa judicial com um vizinho Foto: André Freitas / AgNews
Luize Altenhofen havia se envolvido em uma disputa judicial com um vizinho
Foto: André Freitas / AgNews

A Justiça já havia pedido a retirada dos comentários do ar em abril, mas, de acordo com os jornais brasileiros, o Facebook no Brasil alegou que tal "incumbência" caberia a empresas distintas e autônomas, Facebook Inc. e Facebook Ireland LTD., localizadas respectivamente nos Estados Unidos e na Irlanda.

Na quarta-feira, o juiz deu à rede social 48 horas para cumprir a determinação judicial. Na quinta-feira à noite, o Facebook atendeu à determinação para evitar que Embratel, Telefônica, Vivo, Globalcross, Level 7, Brasil Telecom bloqueassem todos os IPs do domínio Facebook.com nos cabos Americas I, Americas II, Atlantis II, Emergia SAM I, Globalcrossing, Global Net e Unisur, como determinava o despacho do magistrado.

"Como poluição"

O professor de Sistemas de Informação Jimmy Huang, da Universidade de Warwick, na Inglaterra, diz que o caso mostra a "confusa interconexão" de fatores em casos como esse.

Huang destaca a colisão entre a abrangência doméstica das leis sobre internet e o alcance internacional da infraestrutura e do conteúdo das redes sociais, neste caso, o Facebook. Seis em 10 dos mais populares sites do gênero são banidos na China, por exemplo.

"Na verdade, bons ou maus, certos ou errados, a partir de nossas próprias percepções, muitos países têm uma Constituição para legitimar essas ações. Esses sites de mídia social, muitas vezes, são forçados a tomar decisões de negócios e moldar suas práticas com base nesses marcos legais e políticos. Alguns decidiram não ceder e saíram, caso do Google na China".​​

O diretor do Centro de Tecnologias Sociais e Criativas Goldsmiths, Universidade de Londres, Chris Brauer, vai na mesma linha. Ele afirma que a decisão do juiz é "mais um exemplo da complexidade das leis locais em um mundo digital e globalizado".

"Dados são como a poluição. Não respeitam fronteiras e seu gerenciamento requer ações coordenadas e tratados globais. Mas enquanto não houver uma regulação internacional comum, o Facebook precisa fornecer respostas cultural e juridicamente plausíveis, de acordo com leis e costumes locais", observa ele à BBC Brasil.

Brauer critica a demora do Facebook em atender à demanda da Justiça brasileira. "Argumentar que o Facebook, embora autorizado a operar como empresa no Brasil, não precise respeitar as decisões judiciais brasileiras não é razoável. É semelhante a um comportamento colonial. Como qualquer empresa global, o Facebook tem a opção de decidir se quer oferecer serviços no Brasil ou não. Se optar por fazer negócios lá, deve arcar com a gama de compromissos e direitos soberanos da nação".

"Solução fácil"

Já o porta-voz da Index on Censorship, grupo que faz campanha para a liberdade de expressão, concorda que o Facebook deve respeitar a lei e a determinação da Justiça brasileiras, mas alerta para o perigo da "solução fácil", representada pela decisão judicial de tirar completamente o site do ar, o que atingiria milhões de usuários.

"Em última análise, sim, as empresas têm que cumprir a lei. Mas as leis devem ser sensíveis à liberdade de expressão e não ameaçá-la, especialmente em uma época em que a informação é negócio. Ameaçar todo a Facebook mostra desrespeito à liberdade de expressão, algo comum à forma como juízes e governos lidam com a web, utilizando o bloqueio de sites como uma solução fácil", disse Padraig Reidy à BBC Brasil.

Reidy afirma que a decisão do juiz, se levada a cabo, "não apenas teria afetado a liberdade de expressão de todos os usuários do Facebook no Brasil, que não têm nada a ver com este caso, mas também poderia ter prejudicado os negócios que dependem do Facebook para propaganda e publicidade".

"Há um paralelo no Paquistão, onde o YouTube foi bloqueado por causa de um único vídeo "blasfemo" (que atacava muçulmanos). É uma medida restritiva e punitiva, contrária à liberdade de expressão", alerta. "A ameaça ao Facebook é muito perigosa".

Huang, da Universidade Warwick, discorda, porém, que a eventual decisão de tirar um site de rede social do ar seja "uma solução fácil" por parte da Justiça.

"Como não há consenso internacional sobre como regular as redes sociais, nenhuma solução é fácil. Sempre haverá gente insatisfeita", reflete. 

"Liberdade parcial"

Entidades internacionais veem com preocupação o aumento de ações governamentais e judiciais para tentar bloquear conteúdo na internet. Em seu relatório de 2013, a organização Freedom on the Net, alerta para o aumento do controle na rede mundial de computadores.

Afirma que o cenário global piorou em relação a 2012, e uma das causas é a perseguição de usuários de mídias sociais. A maioria dos casos, porém, está relacionada a questões políticas, principalmente em países não democráticos.

O Brasil ocupa a 31ª posição entre 60 países examinados, e é considerado um local de "liberdade parcial" na internet. "Em uma tendência perturbadora, ameaças, intimidação e violência contra jornalistas online e blogueiros vêm crescendo nos últimos anos", diz o relatório sobre o país.

De acordo com o relatório, que tem quase 900 páginas, a situação no Brasil se degradou no último ano devido a ações legais e de governo contra o jornalismo online e redes sociais, e mudanças na legislação, com introdução de novas leis, como a chamada Lei Azeredo, que, entre outras medidas, cria uma polícia para combate a crimes informáticos.

Da Redação

Alguns juízes, talvez despreparados para a função, não analisam as causas de suas decisões e, para favorecer um, prejudicam outros que podem ser dezenas, centenas, milhares ou, como nesse caso, milhões. Nossa opinião é que agentes públicos, de qualquer poder, venham a responder, também, pessoalmente por seus atos e ações.

Nesse caso, os prejudicados poderiam mover ações de perdas e danos morais e materiais contra o Estado e contra o juíz que tomou a decisão, no mínimo absurda para uma era globalizada, que poderia ter causado prejuízo a milhões de internautas.

Aqueles que possuem o controle do poder precisam reciclar suas ideias, suas atitudes e sua forma de agir diante de casos como esse.

Recentemente vimos um caso que assombrou a redação. Um juíz de uma vara trabalhista penhorou as contas correntes de uma empresa (online) para que um ex-funcionário, autor da ação, fosse beneficiado e, naquele momento impediu que nada menos que 1,5 mil funcionários que trabalhavam na empresa não recebessem seus salários e que diversos fornecedores não fossem pagos. A decisão do juíz em questão promoveu um prejuízo não só à empresa réu no processo, mas também estendeu a atitude de penalizar para outras empresas e milhares de famílias. Então o que é justiça? Como ela deve agir e quais são os seus limites?

Como podemos notar, antes de regular como deve a "internet" se comportar no Brasil, devem os legisladores repensar como os poderes devem agir diante de situações onde, ao favorecer poucos, se prejudica milhões. 

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