Na continuação da análise da acusação de compra de votos de parlamentares do PP, o revisor do processo do mensalão, Ricardo Lewandowski, votou nesta segunda-feira pela condenação do ex-deputado Pedro Corrêa, do ex-assessor parlamentar João Claudio Genu e do sócio da corretora Bonus Banval Enivaldo Quadrado por formação de quadrilha. Lewandowski também entendeu pela condenação de Genu por corrupção passiva e de Quadrado por lavagem de dinheiro, mas absolveu o outro sócio da Banval, Breno Fischberg, das acusações.
"Entendo como demonstrada a estabilidade e a permanência do vinculo subjetivo estabelecidos pelos réus para cometer os crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro", disse o revisor no fim de seu voto.
O ex-deputado Pedro Corrêa já havia sido condenado por corrupção passiva na última quinta-feira, no início do voto de Lewandowski sobre o PP. Na ocasião, Lewandowski disse que ficou comprovado o recebimento de dinheiro repassado pelo PT por parte do ex-presidente do partido. Ele absolveu, no entanto, o deputado federal Pedro Henry (PP-MT), por falta de provas. O ex-líder do PP José Janene, morto em 2010, é citado na denúncia por ter articulado o recebimento do dinheiro, mas seu processo foi considerado extinto.
Ex-assessor da liderança do PP na Câmara dos Deputados, João Claudio Genu é acusado de ser intermediário dos pagamentos repassados pelo PT ao partido. A sigla teria recebido ao menos R$ 4,1 milhões para, em troca, apoiar o governo de Luiz Inácio Lula da Silva em votações no Congresso Nacional. A corretora Bonus Banval é apontada como responsável por lavar parte do dinheiro entregue ao partido.
Para Lewandowski, Genu foi encarregado pelos ex-deputados Pedro Corrêa e José Janene para o recebimento dos recursos. "Ele era muito mais que um intermediário dos repasses", disse, ao considerá-lo culpado por corrupção passiva. Como fez ao analisar a conduta de Corrêa, o revisor entendeu pela absolvição do réu por lavagem de dinheiro, por entender que o réu desconhecia a origem do dinheiro. "Admito a coexistência do crime de corrupção passiva e lavagem de dinheiro por meio do mesmo agente, mas desde que se prove a prática de dois crimes distintos. Não estou convencido que o réu soubesse que o dinheiro vinha da prática desses crimes", disse.
A mesma interpretação não se aplica a Enivaldo Quadrado, sócio da Bonus Banval. Para Lewandowski, Quadrado sabia da origem ilícita do dinheiro do valerioduto ao intermediar saques da agência do Banco Rural da Avenida Paulista, em São Paulo, que totalizaram R$ 605 mil, em março de 2004. O réu, segundo o revisor, também teve participação na utilização da conta da corretora Natimar para realizar operação de lavagem de dinheiro mais complexa.
"As operações engendradas por Marcos Valério e seus sócios, depositando vultosas quantias na Bonus Banval, caracterizam sim mecanismos de lavagem de capitais", disse o ministro.
Apesar de ter sido sócio de Quadrado na Banval, Breno Fischberg não deveria ser condenado por lavagem de dinheiro e formação de quadrilha por falta de provas, opinou Lewandowski. Para ele, o Ministério Público não individualizou condutas contra o réu. Ele ainda argumentou que Marcos Valério citou Fischberg em apenas um depoimento na Polícia Federal, desmentido posteriormente.
"Breno foi denunciado pelo simples fato de ser sócio da Bonus Banval, acusada de repassar valores ao Partido Progressista. Como elemento incriminador, encontrei apenas declarações do corréu Marcos Valério à Polícia Federal. Foi um depoimento na fase inquisitória, e que foi desmentido na fase judicial", disse Lewandowski.
Ao decidir pela absolvição com base no in dubio pro reo (na dúvida, em favor do réu), Lewandowski foi questionado por outros ministros. "Não impressionaria o fato de Breno ter sido o gestor da conta da Natimar?", perguntou Marco Aurélio Mello ao revisor. Lewandowski minimizou, dizendo que o réu era apenas "um dos corretores credenciados" da conta.
Segundo a denúncia, a conta da Natimar dentro da Bonus Banval foi utilizada como mecanismo de lavagem de dinheiro. As empresas de Marcos Valério depositavam dinheiro na Bonus Banval, enquanto Quadrado e Fischberg direcionavam o valor para a conta interna da Natimar, de Carlos Alberto Quaglia, que depositava para os destinatários do PP. Dessa forma, diz o Ministério Público, a origem dos recursos nas contas dos parlamentares aparecia como sendo provenientes da empresa de Quaglia, e não das agências de Valério.
O processo contra o argentino Carlos Alberto Quaglia foi desmembrado no dia 15 de agosto. A Defensoria Pública, que representou o réu, alegou que o empresário teve sua defesa cerceada por não ter sido devidamente comunicada sobre as audiências do processo.
Revisor condena 3 réus do PL, mas absolve Antonio Lamas
O revisor do mensalão, Ricardo Lewandowski, votou nesta segunda-feira pela condenação do deputado federal Valdemar Costa Neto (PR-SP), do ex-tesoureiro do partido Jacinto Lamas e do ex-deputado Bispo Rodrigues por crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. No entanto, o ministro decidiu absolver Antonio Lamas, ex-assessor do extinto PL (agora PR) na Câmara, das imputações de lavagem e formação de quadrilha. Bispo Rodrigues também foi absolvido na análise sobre lavagem.
Parlamentar pelo PL (atual PR) quando o caso do mensalão veio à tona, Costa Neto é o primeiro deputado com mandato condenado pelo revisor da ação penal 470. Segundo a acusação do Ministério Público, acatada integralmente pelo ministro, Costa Neto recebeu R$ 8,8 milhões do valerioduto e usou uma empresa fantasma, a Guaranhuns, para disfarçar a origem do dinheiro.
"Os autos levam-me à conclusão que o réu Valdemar Costa Neto recebeu os valores de Marcos Valério em razão de sua condição de parlamentar. O senhor Jacinto Lamas, por várias vezes, recebeu dinheiro, seja em banco, seja em hotéis ou pessoalmente, que sempre levava o numerário para a residência de Valdemar Costa Neto", justificou o revisor.
A conclusão de Lewandowski surpreendeu o relator da ação, Joaquim Barbosa. O revisor vinha aplicando o princípio do ne bis in idem, cujo conceito significa que ninguém pode ser julgado duas vezes pelo mesmo fato. Foi assim quando inocentou o ex-deputado Pedro Corrêa do crime de lavagem de dinheiro. Na opinião de Lewandowski, ao receber ilegalmente uma quantia de dinheiro, o que caracterizaria a corrupção passiva, o réu não teria a intenção de esconder o montante.
"Não admito que se impute, que se dê ao mesmo fato, uma dupla classificação penal. Por isso não entendo a concomitância automática do crime de corrupção passiva com a lavagem de dinheiro, salvo se existirem outros atos", disse Lewandowski.
Barbosa interpelou o revisor e questionou se ele não reconheceria o artigo 70 do Código Penal, que versa sobre a aplicação de duas penas ao mesmo ato cometido de forma intencional. Lewandowski rebateu afirmando que não utilizaria o princípio no caso de Costa Neto porque teria enxergado operações distintas cometidas pelo deputado. Barbosa retrucou e disse que Costa Neto "vai reclamar, e com razão" porque o revisor aplica um conceito a um réu e não a outro.
"Não creio que o senhor Valdemar Costa Neto tenha motivos para reclamar porque há dois conjuntos de fatos. Em primeiro esse recebimento, pelo réu Jacinto Lamas. Mas houve uma segunda forma, que foi o recebimento por meio da empresa Guaranhuns, que é um mecanismo de lavagem de dinheiro, inclusive forjando um negocio ilícito. Eu penso que é um outro comportamento. Essa é minha modesta opinião e sei que não é majoritária", justificou Lewandowski.
Em relação aos réus ligados ao PR, Joaquim Barbosa votou pela condenação de todos, com exceção de Antônio Lamas, ex-assessor do partido. Valdemar Costa Neto era deputado federal pelo PL e renunciou ao mandato para evitar a cassação em 2005. Foi eleito de novo para a Câmara em 2006 e reelegeu-se em 2010.
Tesoureiro
Lewandowski afastou a tese da defesa e afirmou que a acusação provou que o ex-tesoureiro do PL (atual PR) Jacinto Lamas foi partícipe do crime cometido por Valdemar Costa Neto. Segundo a denúncia, Lamas sacou R$ 1 milhão do valerioduto para o PL. Assim, o ex-tesoureiro participou indiretamente da corrupção passiva, mas tinha conhecimento dos seus atos e, por isso, lhe é imputada responsabilidade. Foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
"Jacinto Lamas era peça fundamental neste esquema, homem de absoluta confiança de Valdemar, um dos fundadores do PL, e viajava frequentemente para Belo Horizonte para receber o cash, o dinheiro", disse o revisor.
Lewandowski ainda condenou Valdemar Costa Neto e Jacinto Lamas pelo crime de formação de quadrilha. O revisor citou a participação de Lúcio Funaro e José Carlos Batista, sócios da Guaranhuns, na intenção de mostrar o caminho do dinheiro que passou pela corretora, apesar de ambos responderem pelas imputações na primeira instância por terem colaborado com as investigações.
O ministro argumentou que Costa Neto e Lamas, ao contrário do que pregaram suas defesas, podem sim ser acusados de formação de quadrilha por terem se associado aos sócios da Guaranhuns, embora estes últimos não sejam citados na denúncia. O crime de formação de quadrilha só ocorre quando há associação de ao menos quatro pessoas para fins criminosos. "A associação foi mantida de forma estável para que fosse cometido de forma sistemática o crime de lavagem de dinheiro", afirmou.
Bispo Rodrigues
Em relação ao ex-deputado Bispo Rodrigues, o revisor pediu a condenação por corrupção passiva, mas o inocentou do crime de lavagem de dinheiro. Segundo Lewandowski, Rodrigues admitiu, em depoimento, ter recebido R$ 150 mil.
Além da confissão, os documentos apresentados pela denúncia e outros depoimentos comprovam que o ex-deputado recebeu o dinheiro por meio de um intermediário - no caso, Célio Siqueira, um dos motoristas do extinto PL. A estrutura do Banco Rural foi utilizada para ocultar a identidade do beneficiário final do dinheiro, mas o ministro descartou a acusação ao afirmar que o Ministério Público não conseguiu provar que Bispo Rodrigues tivesse conhecimento da origem dos recursos.
Assim como Joaquim Barbosa, Lewandowski considerou que Antônio Lamas, ex-assessor do partido, não tinha conhecimento do esquema de distribuição de dinheiro. O réu é acusado de formação de quadrilha e lavagem. "Ele foi ao banco, apoderou-se do numerário e logo se desfez do envelope, sem demonstrar conhecimento do que tinha em seu interior", justificou.