A Justiça de São Paulo condenou, na noite desta quinta-feira, três acusados de terem sido contratados para matar o político Celso Daniel (PT), sequestrado e assassinado a tiros em janeiro de 2002, quando ele era prefeito de Santo André (ABC Paulista). Ivan Rodrigues da Silva, o Monstro, foi condenado a 24 anos de prisão; Rodolfo Rodrigo dos Santos Oliveira, Bozinho, pegou 18 anos de prisão; e José Edison da Silva foi sentenciado a 20 anos de prisão. Todos já cumprem pena em regime fechado por outros crimes. A sentença foi lida pelo juiz Antonio Augusto Galvão de França Hristov, presidente do júri popular.
O julgamento começou por volta das 11h30, no Fórum de Itapecirica da Serra (Grande São Paulo), e foi o segundo relacionado ao caso. O primeiro ocorreu em novembro de 2010, quando Marcos Roberto Bispo dos Santos, também acusado de ter sido contratado para matar Celso Daniel, foi condenado a 18 anos de prisão. Os outros dois acusados de integrar a quadrilha, Itamar Messias dos Santos Filho e Elcyd Oliveira Brito, o John, tiveram seus julgamentos adiados para o dia 16 de agosto, após seus advogados abandonarem o plenário.
Apontado como o mandante do assassinato, o empresário Sérgio Gomes da Silva, conhecido como Sombra, aguarda em liberdade o julgamento, beneficiado por um habeas corpus. Amigo e segurança de Celso Daniel, ele estava com o prefeito no momento em que o político foi rendido, quando deixava um restaurante na capital paulista. Tanto Sombra quanto os demais acusados negam participação no crime.
Motivação política
Aos jurados, o promotor Márcio Augusto Friggi de Carvalho argumentou que os três réus foram contratados para matar Celso Daniel, a pedido de Sombra, porque o político "sabia demais". A tese da Promotoria é de que a vítima teria descoberto que pessoas ligadas a um esquema de corrupção para financiar campanhas eleitorais do PT estavam embolsando o dinheiro desviado da prefeitura.
"O prefeito de Santo André morreu porque sabia demais", disse. "(Ele foi torturado e morto) Para se manter um esquema de desvio de dinheiro do povo (para formar o chamado caixa 2 de campanhas)", completou.
O promotor também lamentou o fato de o Ministério Público não ter identificado as "cabeças" por trás do assassinato, ou seja, os supostos mandantes de Sombra, citando "forças políticas" que impediram o avanço das investigações e as mortes misteriores de sete pessoas ligadas ao crime, como testemunhas, envolvidos e um perito criminal.
"O Ministério Público foi até longe demais (na investigação). Infelizmente, (os membros da Promotoria) não puderam avançar para cima disso", disse.
Para reforçar a tese de "queima de arquivo" e fortalecer a argumentação de "motivação política", o promotor pediu aos jurados que se lembrassem do contexto político da época em que o caso aconteceu: em 2002, o então candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, concorreria à Presidência, e Celso Daniel seria um dos coordenadores da campanha.
"Lembrem-se, senhores, o contexto daquela época: era uma campanha eleitoral para (um) presidente da República que ficaria oito anos na Presidência, com uma campanha financiada por um esquema como esse", frisou.
Embora sustente que Celso Daniel morreu após descobrir os desdobramentos do esquema - conforme relatou um irmão da vítima à Promotoria -, Friggi ressaltou que, como não foi possível avançar nas investigações, é "mera especulação" tentar identificar os interessados em ver Celso Daniel morto.
Os advogados dos três réus tentaram explorar eventuais dúvidas no processo e procuraram emocionar os jurados, sendo que um dos defensores chegou a bater boca com o promotor. Luis Antonio Pires, que defende Ivan Rodrigues da Silva, o Monstro, afirmou que um crime político "não poderia ser julgado no Tribunal de Justiça". A afirmação gerou reação imediata de Friggi, que o corrigiu dizendo se tratar de um homicídio com motivações políticas. Pires, então, tentou evocar dúvida nos jurados. "É mil vezes melhor absolver o culpado do que condenar o inocente", disse.
Patricia Ramunni buscou a absolvição de seu cliente lembrando as motivações políticas para o assassinato. "Os verdadeiros culpados deste crime jamais serão punidos. Não é condenando três favelados que vamos fazer Justiça", declarou.
No momento de maior tensão do julgamento, o advogado José de Ribamar Baima iniciou uma acalorada discussão com Friggi ao questionar o depoimento de uma testemunha protegida. Ao sugerir que ela poderia ser falsa, foi rebatido por Friggi e reagiu aos gritos. "Ouvi o senhor quieto, agora o senhor me escute, meu tempo é curto!", exclamou. Friggi afirmou que Carvalho mentia por conhecer o provimento 32, que regula a proteção de testemunhas. "O senhor me respeite!", exigiu o advogado. O promotor recomendou que ele "se desse respeito". Os debates prosseguiram, e o advogado encerrou a fala dizendo que "se restasse um milímetro de dúvida", os réus deveriam ser absolvidos.
Os advogados Airton Jacob e Ana Lúcia dos Santos - que defendem Itamar e Elcyd, respectivamente - abandonaram o plenário alegando incapacidade de apresentar argumentos e teses em apenas 30 minutos.
Hoje, o diretório do PT em Santo André disse que o partido é o principal interessado em esclarecer os fatos. A legenda sempre rebateu e criticou qualquer ligação com o caso.