Ao fazer seu discurso de despedida do comando da Casa Civil da Presidência da República, o agora ex-ministro Antonio Palocci declarou na tarde desta quarta-feira que sempre trabalhou "dentro da mais estrita legalidade". "Se vim para promover o diálogo, saio agora para ajudar a preservá-lo", disse Palocci durante a cerimônia de posse da nova chefe da pasta, Gleisi Hoffmann.
"Não quero fazer desse ato um momento triste. A vida é uma luta permanente e não costumo me abater pelas pedras no caminho. Até porque fomos avisados pelo poeta: havia e haverá sempre pedras na nossa caminhada. A política é naturalmente conflituosa, por isso é reservado aos librianos ¿ e somente aos librianos ¿ construir pontes sobre as águas turbulentas", disse Palocci.
O ex-ministro relembrou sua participação na campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2002 e o período em que foi ministro da Fazenda, momento que classificou como sendo de "águas turbulentas e pontes frágeis". Em 2006, Palocci deixou o comando da Fazenda por conta do escândalo da quebra de sigilo do caseiro Francenildo dos Santos Costa.
Sobre a atual crise que culminou em seu pedido de demissão, disse que "muitos amigos questionaram" sua decisão, tomada logo depois de o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, arquivar a representação contra o ex-ministro por considerar que não havia fatos que justificassem a instauração de um inquérito.
"De fato, a manifestação confirmou aquilo que vinha dizendo nos últimos dias, que trabalhei na mais estrita legalidade, respeitando rigorosamente os padrões éticos que se impõem aos homens públicos. Ocorre que o mundo jurídico não trabalha no mesmo diapasão do mundo político. Ficar no governo com a permanência do embate político não permitiria que eu desempenhasse plenamente minha função na Casa Civil."
O ex-ministro disse que o embate político comprometeu "progressivamente" suas atividades, pediu desculpas por não ter consultado alguns amigos antes de tomar a decisão, que classificou como "solitária". Palocci encerrou sua fala agradecendo aos líderes partidários. "Divido com vocês a vitória que nós tivemos e assumo a responsabilidade pelas nossas dificuldades".
Ao falar com os jornalistas depois de deixar o cargo, Palocci ressaltou "não carregar nenhuma mágoa, nenhum ressentimento". "Tudo o que eu não levo daqui são mágoas. Alegrias, levo muitas."
"Como durante todo esse período trabalhei muito para que valesse o diálogo, o entendimento, minha permanência num momento de conflito não poderia ajudar o governo", disse o ex-ministro. "Insisto que não carrego nenhuma mágoa, nenhum ressentimento, a política é assim que funciona, a imprensa é assim que funciona, por isso a gente luta pela liberdade de imprensa. A gente sai com respeito, com a cabeça erguida, com a certeza do dever cumprido e com a confiança que a presidente Dilma vai fazer muito pelo País."
A segunda queda de Palocci
De acordo com reportagem publicada pelo jornal Folha de S.Paulo no dia 15 de maio, semanas antes de assumir a chefia da Casa Civil Antonio Palocci (PT) comprou um apartamento em São Paulo por R$ 6,6 milhões. Um ano antes, ele havia adquirido um escritório na cidade por R$ 882 mil. Com os novos bens, o patrimônio do ministro teria se multiplicado 20 vezes em quatro anos. O ministro alegou que o lucro foi gerado por sua empresa de consultoria, a Projeto, dentro da legalidade e declarado à Receita Federal. No entanto, ele alegou que cláusulas de sigilo o impediam de revelar maiores detalhes sobre os contratos ou seus clientes.
Mas a onda de denúncias continuou. Na Câmara, o PSDB levantou suspeitas sobre a liberação rápida de cerca de R$ 9 milhões em restituição do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) logo após o primeiro turno das eleições de 2010 a uma empresa, a WTorre. Os valores, relativos aos anos-base 2007 e 2008, teriam sido liberados apenas um mês e meio após o pedido, em duas operações com diferença de quatro minutos entre uma e outra. Em contrapartida, segundo a oposição, a empresa teria financiado a campanha da presidente Dilma Rousseff no valor de R$ 2 milhões. A WTorre seria uma das clientes da empresa de Palocci.
Pressionado pela oposição e pela própria base para que apresentasse uma defesa em público, Palocci concedeu uma única entrevista sobre o tema. Na noite de 3 de junho, ele afirmou ao Jornal Nacional, da Rede Globo, que sua empresa não atuou com contratos públicos. O ministro disse que trabalhou em fusão de empresas, mas que nunca junto ao Banco Central, ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) ou ao Ministério da Fazenda para resolver problemas das empresas que procuraram seus serviços.
A Procuradoria Geral da República solicitou explicações ao ministro, mas decidiu arquivar os pedidos de investigação por considerar que não houve indícios de procedimentos ilegais. Mesmo assim, a pressão política sobre Palocci não diminuiu e a articulção da oposição para aprovar uma CPI contra Palocci avançava no Congresso. Diante disso, no dia 7 de junho, o principal ministro de Dilma Rousseff pediu demissão.