A regulamentação da Lei Complementar 105, que permitirá à Receita Federal fiscalizar movimentações financeiras mensais acima de R$ 5 mil (no caso das pessoas físicas) e de R$ 10 mil (jurídicas) a partir do ano que vem, ainda deve ser motivo de muita polêmica. Apesar de a Receita afirmar que a medida não vai significar quebra de sigilo bancário, especialistas em tributos acham que haverá, sim, invasão de privacidade. Caberá ao Supremo Tribunal Federal decidir se a medida é constitucional ou não.
A flexibilização do sigilo bancário, obtida pela Receita em 2001 por meio da Lei Complementar 105, foi regulamentada por um decreto publicado no Diário Oficial da União na última sexta-feira. A regra, na verdade, apenas regulamenta a flexibilização do sigilo bancário, obtida pela Receita em 2001 por meio da Lei Complementar 105. O decreto também detalha os tipos de movimentação financeira que terão de ser informados, pelos bancos, ao órgão.
Os bancos que não cumprirem as normas poderão ser multados em, no mínimo, R$ 50 mil. E os funcionários dos bancos que divulgarem as informações que serão tranferidas para a Receita poderão ser demitidos do cargo.
Se a Receita constatar que um contribuinte fez movimentações financeiras que não são condizentes com seus rendimentos (declarados no Imposto de Renda), ele será alvo de investigação. O órgão, espera, assim, poder contar com mais um instrumento para combater a sonegação de impostos.
A legislação que dá poder à Receita de fiscalizar as movimentações financeiras, porém, tem sido contestada desde 2001, quando da criação da Lei Complementar. Isso porque a Receita não teria o direito, de acordo com a própria Constituição Federal, de quebrar o sigilo bancário de pessoas físicas e de empresas - o que só poderia ser feito por meio de ordem judicial.
O secretário-adjunto da Receita, Jorge Rachid, porém, afirma que a medida não vai significar invasão de privacidade. “O sigilo bancário não está sendo quebrado, ele só está sendo transferido para a Receita Federal.”
Medida não é legítima
Para especialistas em tributos, entretanto, a medida não é de todo legítima. “A Receita tem outras formas mais razoáveis de combater a sonegação, como a fiscalização da cobrança do ICMS, que já é feita.
Fiscalizar movimentações de valores baixos como esses é uma espécie de terrorismo que não vai trazer quase nenhum resultado efetivo no sentido de inibir a sonegação e de aumentar a arrecadação”, opina a advogada especializada em direito tributário Elizabeth Libertucci. “A Receita não pode ter a liberdade de invadir a vida privada de alguém sem ter um indício anterior de que há algo de irregular na conduta daquela pessoa.” O advogado João A. E. Santo acha que a decisão da Receita ainda vai gerar muita discussão. “A medida pode ser uma ferramenta eficaz no combate à sonegação, mas é passível de ser questionada”, acredita. Para Santo, existe a possibilidade de o decreto perder validade após análise do Supremo Tribunal Federal (STF). De fato, caberá ao STF decidir se o decreto é constitucional ou não. O Partido Social Liberal (PSL), a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Confederação Nacional do Comércio (CNC) já propuseram, junto ao órgão, ações contra a legislação que dá poder de fiscalização das transações bancárias à Receita. Na opinião do sócio-diretor da Confirp Consultoria Contábil, Richard Domingos, porém, será difícil questionar o poder da Receita. “Antes da Lei Complementar 105 isso poderia ser possível, mas acredito que, agora, não será mais. Quem sentir que teve a privacidade invadida poderá levar a questão à Justiça, mas dificilmente terá seu problema solucionado”, acredita.
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